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Capítulo I - Corpo denso – ego profano



Em verdade muitos nascerão outra vez nas manhãs despertas para colorir em séculos a fuga do quotidiano. Nascerão outra vez nos seres sem amor para enfeitar na morte física toda continuação. Sim, nascerão outra vez nas noites silenciosas para sonhar luas inexistentes e acenar mãos vazias para o eterno.

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O caminho espiritual pode ser seguido por qualquer pessoa. O que se exige é muita sinceridade e pureza de coração. Não se fazem necessários talentos ou qualificações especiais, nem mesmo estudos profundos sobre as sagradas escrituras. Abrir o coração aos ensinamentos dos Mestres é a única condição exigida. Não há necessidade de nenhum estudo técnico a respeito da espiritualidade universal. Já somos o Ser.

As pessoas querem ser divinas, querem ser felizes, querem ter muito amor e confundem o amor com ilusão, com emoção, com paixão e vão para os extremos. Elas querem ter virtudes divinas. Mas por que querem ter aquilo que já são? Não se pode querer ter ou ser aquilo que já se é. O que é necessário é acalmar a mente pensante, porque ela é um aglomerado de pensamentos e não nos deixa sentir o que realmente somos. Somos um ser puro, divino, eterno e presente. Certamente não somos o corpo, porque ele nasce e morre. Que verdade há em nascer e morrer? É um ritual funesto e a esse ritual os homens estão apegados. Praticam esse ritual de apego ao sofrimento, apego ao nascimento e à morte. Tudo isso é ilusório. Só existe a Verdade Suprema, só existe o Ser e este Ser somos nós mesmos.

Então, qual seria a necessidade de se ter um físico? Ele pode ser comparado a um mata-borrão que absorve os problemas psíquicos, mentais, de inconsciência e ignorância espiritual. A grande doença dos homens é a inconsciência espiritual. Deve-se isolar esse vírus que está em cada um. Não há sentido em viver no corpo, simplesmente. É preciso procurar o divino enquanto se está no corpo. Nesse momento estamos num período de manifestação, mas devemos retornar conscientes ao estado de plenitude divina. Aquele que se negar como Ser Divino nega a si mesmo e está apegado ao sofrimento. Aquele que não se apega ao sofrimento procura um Mestre que o inicie no caminho da conscientização espiritual.

Acalmando-se o corpo, a mente e os sentidos eles tornam-se veículos de emancipação, de libertação de todos os males que o homem acredita ter e pelos quais sofre na Terra. Esses veículos são, por muitos, usados como meio de perdição para se deleitarem com bebidas e tóxicos delirantes, para viverem na ignorância e causarem, posteriormente, ciclos intermináveis de sofrimentos.

As pessoas dizem: “meu corpo está cansado, minha mente está cansada, não quero ouvir barulho”. Quem está dizendo: minha mente, meu corpo, meus sentidos? Parece que há um dono de tudo isso. Esse dono é o que somos. Muitos afirmam que o cérebro comanda tudo. E quem comanda o cérebro?

O homem não sabe o que é real e o que é irreal. Ele observa o universo através de uma luneta e nunca percebeu que quem vê é que é real, e o que é visto é o objeto. Temos que nos localizar como o real, como o Ser. A ilusão se desfaz. O que permanece sempre é o observador da ilusão, o Ser Supremo. Quem cria a ilusão é a mente. O universo, que parece tão grandioso, vive apenas na limitação da mente pensante porque cada um vê o universo conforme sua percepção pessoal. Isso não tem a menor importância porque não é importante ver o universo. Importante é aquele que vê e que sente o universo.

Os maha yogues possuem uma linha de discernimento, de intuição pura, que é a própria linguagem do Ser, e vem à tona quando se medita, quando se devociona. A técnica da meditação iniciática aniquila o ego, a mente pensante e tudo o que está ligado a eles. Se existem muitos pensamentos, logo deve existir a fonte deles. Basta eliminar cada um dos pensamentos até chegar ao pensamento “eu”, ou pensamento origem. E quando chegar a ele, pergunta-se: “De onde surgiu esse pensamento?”. Surge aí o guru interno, a voz silenciosa, o pleno discernimento entre o que é real e o que é irreal.

O ego, sendo o primeiro pensamento, já é o primeiro erro, disse Bhagavan Sri Ramana. O pensamento “eu” é o primeiro que surge. Posterior a esse pensamento muitos “eus” aparecem. A isso chamamos de falsos personagens. Os falsos personagens que estão nas pessoas são perigosos, porque as fazem cometer erros e esses erros provêm do primeiro pensamento: “eu”.

Bhagavan Sri Ramana ensina que todo problema está no primeiro pensamento. “Se há um primeiro, logo há um segundo porque as pessoas acreditam em números”, disse ele. E esse número pode-se ampliar à medida que se vão colocando os zeros. Porém é possível notar muitas pessoas se emancipando, permanecendo firmes no caminho espiritual. Estão colocando o zero no lugar certo, ampliando a cifra no sentido de multiplicação e assimilação dos sagrados ensinamentos, utilizando-os como meios de autoconscientização.

Os ensinamentos que os Mestres da Maha Yoga expressam são os mesmos em qualquer época, é a Verdade Suprema, e estão aí para a salvação de todos. Para que criar problemas para si, se na realidade o problema não existe? Para que se unir a idéias, a grupos, a pessoas que puxam para trás? E por que permitir que eles puxem?

Não são só as pessoas que puxam para trás o adepto que deseja seguir o caminho espiritual. Os pensamentos são seus piores inimigos. É necessário cuidar-se para que nenhum pensamento o desvie do sagrado objetivo. Nada que pode tirá-lo do caminho espiritual vale a pena. Nenhuma atração dos olhos, dos ouvidos, do tato pode atraí-lo. Nenhum pensamento pode ser mais forte que o divino.

A parte mais forte do tato está no pensamento “eu sou o sexo”. Cuidado com isso. Não o somos. Não se confundam. As coisas são saborosas, mas se nos apegarmos ao sabor nos intoxicamos. Uma simples fruta, por exemplo, é pura em sua essênsica, é inofensiva, tem vitaminas, tem muita força do plano sideral porque ela recebe a força solar, a força lunar e todas as forças da natureza. A pessoa pode comer uma, duas, mas se exagera na quantidade pode-lhe fazer muito mal. Assim são todas as coisas. Tudo que se faz excessivamente, porque se gosta daquilo, pode conduzir a pessoa para os extremos.

Verifiquem bem o que é na realidade o corpo físico e o porquê de os Mestres virem à Terra. No caso de Bhagavan Sri Ramana e seus discípulos, os ensinamentos vêm destrinchados e explicados claramente. Cada Mestre vem para estabelecer um ensinamento e abrir caminhos de libertação de todos os males. O corpo físico, o ego denso, aquilo que se pode pegar são músculos, sangue, vísceras e há muitos maus pensamentos dentro desse ego, muitos desejos. Isso tudo é a herança de onde nascemos. É preciso vencer a ilusão do ego, porque ele nasceu e vai morrer. Se não tomarmos banho todos os dias ele cheira mal. Isso é o corpo físico. Não nos podemos enganar. O ego é algo que nasce, morre e apodrece ainda em vida. Pode ficar cego, surdo, ter enfermidades e deformações. Afinal, por que lhe conferimos tanta importância, se ele é só isso e nada mais?

É a carne que dá à luz o filho, que é fruto de uma relação sexual, é o fruto de um prazer. Temos que cortar essa corrente de prazer que fica sobre nós. Mesmo meditando, fica um plano mental nos dizendo: “E os prazeres, como serão? Você precisa ter um filho para agradar a seus pais”. Essa união sexual é útil, pois se nossos pais não se tivessem unido não teríamos nascido, e o Mestre não estaria ensinando a seus discípulos. Só que o Mestre enganou seu próprio ego, porque ele meditou e devocionou. Muitos seres podem procriar e não necessariamente aqueles que se encontram no caminho espiritual. Uns procriam e outros realizam a espiritualidade. Isso é um processo. Quem encontrou a Verdade não precisa reter-se no caminho dessa Verdade para procriar.

Existe a lei do nascer e morrer. É a samsara. São os apegos a nascimentos e mortes. É comum os pais desejarem que seus filhos sejam como eles. Querem que o filho seja o que os pais são, isto é, um explorador dos outros, um inconsciente da Verdade Suprema, um apegado às ações. Isso é egoísmo, isso é a prolongação do ego. As pessoas desejam que o filho seja tudo aquilo que elas desejaram ser na matéria e não conseguiram. E assim vão-se esquecendo da verdadeira essência que são.

O corpo nasce do prazer de duas pessoas. Essa é a história da manifestação. A manifestação nasce pelo prazer de nascer. E o ego é uma manifestação com seus apegos, a prolongação de um desejo de nossos antepassados. O que temos que fazer é cortar essa corrente. É natural casar-se. É natural unir-se. Porém acontecem as emoções, a ignorância, as programações tradicionais que proíbem que o próprio casal sinta a unidade. Os seres são unos, mas partem para os opostos, apegam-se aos prazeres do corpo e não os usam em harmonia.

Com a meditação e com a devoção é possível cortar em nós a vibração de posses, de apego às ações, o desejo de prazeres de todos os tipos, que hoje a humanidade experimenta em grande escala e acha que isso é liberdade, é evolução. Mas se isso fosse evolução, não seria necessário virem Mestres ensinar sobre a libertação dessas coisas.

As pessoas dizem que só na antiguidade existia a humanidade perversa que praticava grandes orgias. Mas hoje em dia há milhares de cidades, e até mesmo comunidades que se dizem espirituais, na depravação mental, sexual, possuídas pelos tóxicos.

Os planos manifestados, maya, são falsos. Os Mestres de todas as épocas têm ensinado isso. O adepto medita e descobre por que a manifestação é falsa. Nela há muito treinamento, mas é preciso ter cuidado para não ficar observando-a e analisando-a. Conta uma lenda antiga que certa pessoa gostava de observar a maya, pois achava que aprendia muito dela. Um certo dia foi atingida por uma flecha e, quando veio o médico, a pessoa se recusou a extraí-la para ver sua origem, de que direção viera, de que material era feita pois achava muito importante aprender de toda experiência que maya proporcionava. Porém, queria observar tanto que, quando permitiu que o médico a curasse, morreu.

É preciso ter cuidado para não ficar tanto na matéria que se acaba morrendo espiritualmente. Há pessoas que fazem escavações de coisas antigas achando que vão aprender algo. E se as mandarmos meditar, dizem que somos alienados, que a Índia toda é alienada, que todo Mestre é alienado. E elas, o que são, que exploram túmulos de faraós à procura de múmias? O Mestre lhes oferece a consciência do divino, mas elas se recusam e dizem que vão atrás da múmia, atrás da morte, atrás de um faraó que há milhares de anos enterrou seu próprio ego, que pode ter sido um rei déspota que matou muitas pessoas e que estava preso ao poder, à corrupção. Que segredo há em uma múmia, ou em um tesouro escondido em algum lugar do Himalaia? Há pessoas que escalam o Himalaia e quando chegam ao topo dizem: “Subi”. E daí? Terão que descer. Se ficassem lá em cima emancipadas, todos os Mestres subiriam. Mas se estão lá, não emancipadas, têm o perigo de morrer de frio. Essa é a maya. Ela é quente, fria, é dualidade.

Temos que discernir o que é real e o que é irreal. Nada é proibido na Maha Yoga. Não somos contra nada. Apenas damos os ensinamentos. Se alguém acha que foi atacado, isso é problema dele. Vai ter que resolvê-lo. O Mestre dá o ensinamento em sua totalidade. Se a pessoa entende cinco por cento dele já é alguma coisa. Se não entendeu nada, está muito mal, está-se auto-enganando, pois os ensinamentos são bastante claros.

O Mestre alerta a todos para ficarem bastante atentos. Não se podem adaptar os ensinamentos a interesses próprios e se auto-enganar. É preciso ver a realidade. Há aqueles que são muito bons discípulos, mas eles próprios colocam pedras em seus caminhos, as quais se tornam difíceis de serem removidas. E outros ainda tentam formar montanhas de obstáculos em seu caminho espiritual. Isso é perda de tempo porque terão que os eliminar com suas próprias forças. Então o trabalho é duplo. Se o adepto notar que está lutando contra alguma coisa que lhe traz sofrimento, mas mesmo assim deseja possuí-la vai, indubitavelmente, responder por essa falha. O próprio adepto a cria e ele mesmo deve desfazê-la. Nada tem o Mestre a ver com isso.

O problema do homem é o apego. Muitos se apegam até ao divino. Nem ao divino deve-se apegar. É preciso destruir a falsa idéia de que se é o corpo, a mente, os sentidos, os desejos. O ego tem que se render ao Ser Supremo. Na meditação iniciática ativa-se a parte divina, ativam-se todos os veículos de conscientização espiritual para que tudo isso se processe. Esse é o começo da consumação do ego profano. A partir daí ele está fadado a se entregar. Nesse período o ego passa a ser submisso, perdendo a força. É ego profano enquanto for contrário a meditar, a devocionar, enquanto conduz o adepto aos apegos. Quando deixa de ser profano, passa a ser chamado, na Maha Yoga, de veículo de conscientização. Dissolve-se o sentido “eu” e surge conscientemente o Ser. A sensação de “eu”, “tu” deixa de existir na pessoa, ficando só a consciência do Ser Absoluto. Então não haverá mais ciúme, inveja, preocupação, insegurança. Essas sensações pertencem ao ego, à mente. Quanto mais o adepto se submergir na própria essência, que é o Ser, mais essas sensações desaparecem.

Todos são o divino, mas é necessário cortar as arestas. O ego é um nefasto companheiro enquanto se está com ele, mas pode também obedecer e ser submisso. Quando isso acontece, ele se dissolve e aí permanece o que todos são, o Ser.

O ego profano é ilusório. O Ser Supremo que se reflete em todos os seres do universo é eterno e não sofre modificações. O Ser é a expressão máxima da Verdade Suprema, o ego profano é oposto à Verdade, e assim sendo, manifesta a falsidade em todos os aspectos, ante os olhos dos ignorantes da Verdade. O ego profano gera o ódio, a calúnia, a lascividade, o assassinato, o roubo e tudo aquilo que causa dano; e o Ser Supremo é a força eterna das virtudes divinas.

O ego profano provém da profundeza da inconsciência e ignorância espiritual dos homens. Ele oferece prazeres e ganâncias satisfatórios, mas seus resultados são a intranqüilidade, a miséria e a morte. O ego dá aos homens frutos frondosos aos olhos e agradáveis ao olfato, mas por dentro estão recheados de amarguras.

Quem conhece bem o ego profano, conhece o mundo ilusório e sabe que as coisas que ele oferece são transitórias; quem conhece a Essência Universal, é consciente do Ser Supremo e sabe muito bem que ele é eterno.

(Extraído do livro "Ser", de Sri Maha Krishna Swami)


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